8 anos da PNRS: 53% das cidades do Brasil ainda destinam lixo incorretamente

Brasil só alcançará meta da ONU 30 anos depois do prazo, segundo o Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU).

Após 8 anos de Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), apenas seis municípios brasileiros alcançaram a faixa de pontuação mais alta do Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU), criado em 2016 para mensurar o grau de aderência das cidades às metas e diretrizes por ela fixadas. De acordo com o estudo, entre as cidades participantes, 53% continuam destinando o lixo incorretamente – apesar do prazo para erradicação dos lixões ter expirado em 2014 –; a coleta domiciliar está longe da universalização, atendendo cerca de 76% dos lares brasileiros; 61,6% dos municípios ainda não estabeleceram fonte de arrecadação específica para custear a atividade; e o índice médio de reciclagem no Brasil não passa dos 3,7%.

“A legislação é moderna e extremamente positiva, mas oito anos depois o Brasil ainda está patinando na sua implementação. A falta de recursos financeiros desponta como o problema número um da lista, mas há outros pontos igualmente cruciais, como o desafio de elevar a capacitação técnica dos gestores públicos no tema e a inexistência de ferramentas estruturadas para identificar pontos de melhoria e mensurar avanços, ajustes e soluções para a consecução da PNRS”, destaca Marcio Matheus, presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), que desenvolve a pesquisa em parceria com a consultoria PwC (PricewaterhouseCoopers).

Assim como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da ONU, o ISLU varia entre 0 (zero – baixo desenvolvimento) e 1 (um – alto desenvolvimento) e analisa os dados oficiais mais recentes disponibilizados pelos próprios municípios no Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Nesta 3ª edição, o estudo mostra que das 3.374 cidades que participam do SNIS, 333 (9,9%) aparecem no nível “muito baixo”; 868 (25,7%); baixo; 1.731 (51,3%), médio; 436 (12,9%), alto; e apenas seis (0,02%) atingiram o “muito alto”.

“As melhores notas estão nas regiões Sul e Sudeste e em cidades pequenas que concentraram esforços em soluções regionalizadas. Mesmo quando fazemos o recorte para municípios com mais de 250 mil habitantes, os resultados mais expressivos encontram-se nessas regiões. Para que os municípios das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste alcancem o mesmo patamar é preciso que instituam, dentre outros, mecanismos para incrementar a reciclagem e a universalização dos serviços de coleta, de arrecadação específica para o custeio da atividade, a exemplo do que ocorre com os serviços de água, luz, gás e telefonia, e de racionalização dos custos por meio da inteligência de escala proporcionada pela adoção de soluções compartilhadas”, afirma Federico A. Servideo, sócio da Prática de Consultoria da PwC, explicando que o estudo mede a adesão da cidades brasileiras aos preceitos da PNRS por meio de análise estatística de indicadores em quatro dimensões: engajamento, recuperação de recursos coletados, sustentabilidade financeira e impacto ambiental.

A pontuação varia de zero a um, na qual, quanto mais próximo de um, maior será a aderência da cidade à PNRS.

Foto: Divulgação

Compromisso com a Cúpula das Nações Unidas não deve ser cumprido

O estudo projeta que se o Brasil continuar no ritmo atual não conseguirá atingir as metas ligadas à gestão de resíduos sólidos assumidas durante a Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, em setembro de 2015, que estabelecem melhorias até 2030. Se nada mudar, o país não conseguirá alcançar a meta da ODS 11.6, referente à redução do impacto ambiental dos resíduos, em menos de 15 anos. Mantido o atual ritmo de implementação, a meta de reduzir substancialmente a geração de resíduos por meio da prevenção, redução, reciclagem e reuso (ODS 12.5) até 2030 não será atingida em menos de 30 anos depois do prazo.

“O Brasil precisa priorizar essa agenda para honrar o compromisso assumido perante a comunidade internacional. Temos legislações modernas e positivas, mas precisamos colocá-las em prática. As projeções do ISLU são absolutamente preocupantes porque demonstram claramente que o ritmo da implementação das ODS precisa ser intensificado. É um alerta fundamental e uma excelente ferramenta para que os gestores públicos possam medir seus desempenhos”, avalia Carlo Linkevieius, secretário executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) constituem uma agenda mundial composta por 17 objetivos e 169 metas a serem atingidas até o ano de 2030 pelos países signatários, dentre os quais o Brasil, englobados os seus entes federativos, ou seja, todos os estados e municípios.

Os 17 ODS representam um conjunto de responsabilidades que cada país assumiu a para superar, até 2030, os desafios que afligem a humanidade. Entre eles, dois são relacionados à gestão de resíduos: ODS 11.6 e 12.5.

Inexistência de arrecadação específica para sustentabilidade dos serviços é um dos principais gargalos

De acordo com o ISLU, no Sul do Brasil a destinação final ambientalmente correta (aterros sanitários) chega a 88,5%, e no Sudeste o indicador fica em 51,1%. Norte e Centro-Oeste ficam com 14,1% e 14,4%, respectivamente; enquanto o Nordeste não passa dos 11,4%.

Quando o assunto é arrecadação específica para custear os serviços de limpeza urbana, o estudo mostra que 75,8% dos municípios do Sul e 40,3% do Sudeste já encontraram uma forma de captar recursos para este fim. Nas outras regiões do país, no entanto, os percentuais são extremamente baixos: Centro-Oeste 18,8%, Norte 14,7% e Nordeste 4,9%.

“Esses são dados importantes porque sabemos que as prefeituras não têm recursos suficientes no orçamento para subsidiar os serviços. Por isso, muitas acabam enviando os resíduos locais para lixões, o que é ilegal. Fica claro que as que conseguiram tratar a coleta e o manejo de resíduos como uma ‘utility‘, adotando uma das premissas da legislação, que é garantir a sustentabilidade econômico-financeira para a realização das atividades, conseguem melhorar os seus resultados em praticamente todos os indicadores”, afirma Carlos Rossin, engenheiro especialista em sustentabilidade e resíduos sólidos e um dos idealizadores do estudo.

Reciclagem

O ISLU demonstra ainda que os índices de reciclagem são irrisórios no Brasil. A média nacional não passa dos 3,7%, melhorando um pouco nas regiões mais desenvolvidas: 7,28% no Sul e 3,90% no Sudeste. Já no Centro-oeste o percentual de material reciclado fica em 1,40%; norte, 0,80%; e nordeste, apenas 0,50%.

A realidade é pior em algumas das grandes cidades brasileiras. Das 20 maiores cidades do país, apenas Goiânia tem índice de reciclagem superior à média brasileira: 4,38%. Já considerando os municípios com mais de 250 mil habitantes, Viamão – RS é a cidade com maior índice de reciclagem, com 9,9%.

Universalização

Outro fator importante ao analisar a gestão de resíduos sólidos no Brasil é a cobertura do serviço de coleta de lixo domiciliar. Neste quesito, o Sudeste se sai melhor, com uma cobertura que envolve 84% das residências. A segunda melhor região é a Centro-Oeste, com 81%. O Sul, que lidera em quase todos os índices, tem uma taxa de 72%, enquanto Nordeste e Norte contam com 66% cada.

Maior pontuação

O município de Caxias do Sul se destacou, obtendo a melhor pontuação entre o grupo de cidades com mais de 250 mil habitantes: 0,745. A cidade gaúcha tem 100% de seu território atendido pela coleta domiciliar e é uma das cidades onde existe uma fonte de recursos específicos para o serviço, a taxa de coleta de lixo.

As cidades que possuem este tipo de arrecadação possuem uma média maior de universalização (80%) e de destinação correta (72%). Caxias, particularmente possui taxa de reciclagem de 8,45%.

Cidades de maior aderência à PNRS (quadro nacional):

Foto: Divulgação

Cidades de maior aderência à PNRS (Acima de 250 mil habitantes):

Foto: Divulgação

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