O preço da flexibilização da Lei Cidade Limpa em São Paulo

Poluição visual. Talvez a nova geração de paulistanos não compreenda exatamente o que esse termo quer dizer. O assunto, tão debatido no passado, praticamente perdeu o sentido após a aprovação da lei municipal 14.233 de 2006, que ficou amplamente conhecida como Cidade Limpa e mudou a cara de São Paulo.

Wilson Pedroso, analista político – Foto: Acervo Pessoal

Com regras rígidas para a publicidade e fiscalização eficiente, a Cidade Limpa foi o grande marco da gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab. A lei acabou com outdoors, reduziu a dimensão das placas nos estabelecimentos comerciais, proibiu propagandas em espaços públicos. Como resultado, a cidade apareceu com sua grandiosidade, monumentos e prédios históricos; ficou mais limpa e mais bonita. Porém, quase 20 anos mais tarde, a Câmara de Vereadores quer agora escondê-la novamente.

O projeto de lei, de autoria do vereador Rubinho Nunes (União Brasil), é de 2023 e ninguém deu muita atenção à proposta, em meio a tantas outras que também querem alterar as normas publicitárias na capital, até ser aprovada em primeira votação em maio deste ano. Agora, o Legislativo paulistano anunciou a realização de audiências públicas para discutir o projeto.

Gilberto Kassab reagiu e foi à imprensa convidar os paulistanos e os milhões de filhos adotados da capital para que se posicionem contra a flexibilização das regras de publicidade. E tem muita gente que o apoie. Entre eles, por exemplo, está o ex-ministro e empresário Andrea Matarazzo, que criou um abaixo assinado em defesa da Lei Cidade Limpa.

Mas o tema é polêmico porque esbarra em outro problema sério: a necessidade de revitalização da área central. O prefeito Ricardo Nunes e o governador Tarcísio de Freitas já chegaram a firmar entendimentos sobre a criação de grandes corredores culturais e comerciais na capital, que seriam iluminados por telas de led e inspirados na Times Square, de Nova York. O projeto poderia transformar a paisagem em regiões como a Santa Efigênia e a Rua São João, além da Avenida Paulista.

No papel, a ideia é boa e significa uma esperança de dar ao centro de São Paulo o valor que merece. Mas, e na prática? Será mesmo que os painéis de led teriam força para levar novos investidores a uma área cada vez mais empobrecida e deteriorada? Os turistas iriam querer caminhar e consumir pelas ruas centrais, a poucos quarteirões da cracolândia? A resposta para essas perguntas é complexa.

O projeto pode funcionar, mas precisa ser grande. Exige que outras iniciativas sejam integradas a ele, como é o caso do Smart Sampa que usa câmeras e inteligência para combater a criminalidade no centro da cidade. Além de segurança, o comerciante também vai precisar de incentivo para investir em ações de qualidade, que realmente possam atrair os turistas e os consumidores da própria cidade. E o poder público precisará igualmente implantar grandes atrativos nessa nova região turística. Ou seja, não estamos falando apenas de autorização para publicidade. A questão é bem mais ampla.

Se todo o projeto for de fato bem arquitetado e vier a sair do papel, talvez a flexibilização da Lei Cidade Limpa encontre algum sentido. Do contrário, o preço das mudanças poderá ficar alto demais. E essa é uma conta que certamente não vamos querer pagar.

*Wilson Pedroso é consultor eleitoral e analista político com MBA nas áreas de Gestão e Marketing

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