Quando a realidade mente

Foto: Divulgação

Pedro sempre foi considerado muito inteligente e articulado. Um dia, caminhando na rua, começou a escutar vozes que lhe diziam para tomar muito cuidado. Cada pessoa com quem cruzava oferecia algum tipo de perigo e as vozes diziam para ele se afastar delas o mais rápido possível.

Quando chegou a casa, deitou-se no sofá e dormiu. Depois, não pensou mais nesse episódio. No entanto, conforme o tempo foi passando, sentia que estava correndo perigo. Pensou estar sendo perseguido e que todos eram seus inimigos. As vozes voltaram com força total e ele começou a evitar todos os seus conhecidos, pois temia que pudessem lhe fazer algum mal.

Cecília estava em casa lavando a louça quando, de repente, vê um inseto asqueroso andando na pia. Afasta-se, com nojo, e percebe outros insetos se juntando ao primeiro. Corre para a sala e os insetos vão atrás dela e a encurralam perto da parede. Começam a subir por suas pernas e Cecília grita desesperada. Por fim, desmaia. Quando acorda, não há mais inseto nenhum.

A esquizofrenia é uma doença mental grave e perturbadora, onde ocorre uma diminuição do sentido da realidade que leva a um comportamento irracional e a reações emocionais perturbadas. Prejudica o senso de realidade, a capacidade de se relacionar e de conviver socialmente.

A esquizofrenia é complexa e assustadora, pois os sintomas ultrapassam totalmente o domínio da experiência da maioria das pessoas.

A doença surge de forma gradual. O indivíduo afetado começa a perder a energia e a motivação pessoal e tornar-se cada vez mais fechado ao longo de meses ou anos. Em outros casos, a doença é mais repentina, podendo ser uma reação a um episódio de estresse. Algumas pessoas têm episódios bem nítidos da doença, recuperando-se completamente entre seus intervalos. Em outros casos, o distúrbio é mais ou menos contínuo.

Os sintomas da esquizofrenia podem ser positivos ou negativos.

Os sintomas positivos mais comuns são a alucinação e o delírio.

Na alucinação há uma percepção irreal. O indivíduo percebe o que não existe. Ele acredita naquilo que ouve, vê ou sente e, no entanto, o que está vivendo é irreal. Alguns pacientes sentem bichos andando em cima deles. Outros ouvem vozes imaginárias. Outros veem pessoas ou animais que não estão presentes. Das alucinações, as auditivas são as mais comuns.

Já o delírio se refere a crenças irracionais, principalmente de que os pensamentos e ações estão sendo controlados por uma força exterior. O indivíduo se sente perseguido, vigiado (delírio de perseguição) ou acredita que tem uma missão especial, que é onipotente (delírio de identidade). Um delírio bastante comum é acreditar na traição do parceiro e encontrar provas em qualquer fato ou situação.

Os sintomas negativos são o embotamento afetivo, pobreza de discurso, falta de inflexão vocal, pobreza de expressão facial e gestos expressivos, avolição. O indivíduo pode ficar horas sem se mexer, como se fosse uma estátua de cera.

Esquizofrênicos apresentam emoções inadequadas como rir ao receber uma má notícia, comunicação incoerente, mudança rápida de um assunto para o outro. Há dificuldade de concentração, pensamentos e movimentos lentos, desânimo ou depressão.

O indivíduo com esquizofrenia pode negligenciar a higiene pessoal e fechar-se cada vez mais. Em alguns casos, pode se tornar violento.

É um transtorno sério com uma ampla gama de sintomas incomuns. É preciso procurar um tratamento o mais rápido possível na tentativa de não deixar o distúrbio progredir.

Na maioria dos casos, a esquizofrenia é uma doença de longa duração. Contudo, cerca de uma em cada cinco pessoas afetadas têm apenas um único episódio do qual se recuperam, levando depois uma vida normal. A maior parte tem vários episódios, com graves sintomas. O prognóstico é pior para as pessoas que desenvolvem a esquizofrenia gradualmente quando jovens.

Medicamentos antipsicóticos são os remédios principais usados no tratamento. Funciona para psicose, mania e depressão. Porém, não é muito eficaz para os sintomas negativos.

Podem ser necessárias ao menos três semanas de tratamento para reduzir os sintomas mais óbvios de esquizofrenia. Alguns medicamentos podem causar sérios efeitos secundários, como tremores, e deve haver monitoramento constante de sua dosagem pelo médico.

É muito importante que o paciente receba apoio familiar e que usufrua de um ambiente calmo e pacífico. A pessoa que sofre de esquizofrenia tem que ser protegida das situações causadoras de estresse, pois a ansiedade pode desencadear os sintomas. As visitas ao médico devem ser mantidas para que haja acompanhamento de sua progressão e bem-estar.

Pedro, após medicado, formou-se em psicologia e passou a trabalhar com saúde mental em um hospital público.

Cecília visita o médico a cada seis semanas e toma seus medicamentos regularmente.

Sim, é uma doença mental séria e complicada, mas a terapia e a medicina podem ajudar o indivíduo a superar as fases mais trágicas do transtorno e até mesmo possibilitar uma vida relativamente normal.

*Artigo assinado pela Lucia Moyses, psicóloga, neuropsicóloga e escritora. Lúcia lançou seu primeiro livro “Você me conhece?” em 2013 e o “E viveram felizes para sempre”, em 2015, ambos voltados para a psicologia. Em 2016, após se especializar em neuropsicologia, lançou os três primeiros livros da coleção DeZequilíbrios, uma série de 10 volumes onde cada um aborda um transtorno mental em forma de ficção, suspense e romance. Em 2018 lançou mais três livros da coleção “A Mulher do Vestido Azul”, “Não Me Toque” e “Um Copo de Veneno”.

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