O que há por trás do sombrio reino do leite condensado

Pobre país cujas elites recalcadas pariram um monstrengo e hoje fingem surpreender-se com seu bizarro comportamento de predador compulsivo...

Embora indignante, a escandalosa prática de “corrupção formiga” (em todos os sentidos) em que se desvia dinheiro público em, digamos, “conta-gotas” (sic) não surpreende nem os mais desavisados habitantes do sombrio reino do leite condensado.

Foto: Divulgação

Mas, claro, as elites dir-se-ão estupefatas. Logo elas que, por puro recalque anacrônico que as remeteu ao século XIX (auge da escravatura), cravaram o punhal traiçoeiro na frágil, mas efetiva, democracia conquistada por generosas gerações ao longo de décadas no século XX.

Cínicas, insistirão em seu mantra de que “fizeram esse sacrifício” para salvar o país da anarquia iminente – como que anarquia fosse dar voz e vez aos milhões de brasileiros que não só engordaram suas fortunas ao aquecer o mercado interno para, pela primeira vez na história, ter acesso a bens de consumo antes produzidos para o exterior, dentro da ignóbil lógica do “exportar é o que importa”.

Retornando, agora, ao indigesto escândalo da compra em mais de 15 milhões de reais de latas de leite condensado por 162 reais a unidade, nada surpreende vindo de onde vem.

Ainda que não fosse de conhecimento público e notório o esquema de “rachadinhas” que enriqueceu a famigerada dinastia dos desatinados membros do baixo clero parlamentar desde o primeiro quinquênio posterior à promulgação da Constituição Cidadã (contra a qual, aliás, a horda de patéticos saudosistas do regime de arbítrio se levantou inúmeras vezes), a reiterada prática do rola-bosta é por demais reconhecida em todos os meios.

Por questão de princípio e para não ofender os roedores que prestam relevantes serviços dentro da cadeia alimentar (que por quase um século tiveram na figura emblemática de Mickey Mouse o “american way of life”), usaremos o termo coprófagos, alusivo aos chamados come-bosta que infestam todos os quadrantes do planeta, esta conduta predadora, própria de monstrengos saídos da caixa de pandora da casa grande.

Já dizia o arguto Doutor Ulysses Guimarães que as hienas sorriem para as suas presas enquanto selam seus destinos sem qualquer compaixão. Desde que os pseudodemocratas liderados por Aécio Neves, Geraldo Alckmin, José Serra e Roberto Freire decidiram deter o processo democrático em 2016 – na ânsia de encontrar um atalho para o tão sonhado retorno às gordas tetas do erário -, a imersão da então promissora potência pacifista ao sombrio reino medieval era iminente.

Miguel Michel Temer Lulia não vem ao caso; é a mais exata tradução da vil e lúgubre pinguela do pandemônio, mordomo mefistofélico. O monstro mesmo veio via eleitoral, feito um voraz e sórdido estupro ao Estado Democrático de Direito. Desde o fatídico dia em que seu sorriso de lagarto matreiro veio à tona em uma mórbida sessão de pajelança neopentecostal liderada por Magno Malta, depois regada a café passado pelo anfitrião com pãozinho de sal e, pasmem, leite condensado (sic), era previsível a sucessão de idas e vindas rumo a lugar algum, ao nada – não, rumo às centenas de milhares de vidas ceifadas por genocidas ávidos, feito “papa-defuntos”…

A bem da verdade, em Nioaque, segundo o genial Professor Altevir, ele não gozava de muita amizade e seu apelido entre os desafetos era “Conde Nado”, coisa que até hoje jura que é intriga. Segundo esse Amigo Professor, desde então era chegado ao comércio formiga, época de ouro dos videocassetes “quatro cabeças”.

Conhecidíssimo ele já era. Sobretudo para essas elites “cançadas” (com “c” cedilhado, mesmo) dos aeroportos lotados, os shoppings entulhados de “povinho” e, pior, com as domésticas cheias de direitos, tendo uma lei só para elas… Isso é demais na cabeça de penico de uma elite que vive de um passado que, a rigor, nunca teve, pois, no tempo do império, vivia das migalhas da corte. Ou, como se costuma dizer, “come farofa e arrota caviar”!

Se não foi golpe mesmo, que o Tribunal de Contas da União, tão implacável com Dilma Rousseff, cumpra com sua missão: além do leite condensado, há cloroquina e muitas outras “inas” a serem rastreadas, e que o Congresso Nacional pare de brincar com o Estado Democrático de Direito que assegurou esse superemprego aos seus mais de 500 membros e fiscalize de fato e de direito os evidentes desvios de função cometidos inúmeras vezes pelos declaradamente inimigos da Democracia, esta construída com o sacrifício de muitas vidas ao longo do século passado.

Afinal, a história aboliu a política do café com leite há quase um século, e as gordas tetas do erário produzem tudo, menos leite condensado…

*Ahmad Schabib Hany

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