Setor de resíduos sólidos pede que Governo Federal vete artigo do novo Marco do Saneamento que permite contratos sem licitação

Dispositivo afasta investimentos privados e pode inviabilizar a universalização dos serviços de coleta, tratamento e destinação final do lixo no Brasil

Entidades do setor de resíduos sólidos vão recorrer ao Governo Federal pedindo o veto do artigo 20 do novo Marco do Saneamento, aprovado no Senado na última quarta-feira, 24/06. O dispositivo afasta investimentos privados e pode inviabilizar a universalização dos serviços de coleta, tratamento e destinação final do lixo no Brasil, que ainda tem mais de 3 mil lixões. Isso porque permite que as prefeituras contratem serviços de limpeza e gestão de lixo sem licitação, por meio de contratos de programas com companhias estatais.

Foto: Divulgação

Para o Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), a permissão vai contra a razão de ser da nova legislação, que, inclusive, eliminou esse modelo para água e esgoto por ser ineficiente e inviabilizar a entrada de empresas privadas e, principalmente, a livre concorrência.

“Sem o veto, corre-se o risco de se perpetuar, agora no setor de coleta e tratamento de resíduos, o mesmo modelo de prestação ineficiente que estagnou os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil nos últimos anos. Será impossível que o país cumpra o compromisso internacional assumido junto à ONU de acabar com os mais de 3 mil lixões a céu aberto e com as recorrentes tragédias causadas pelo descarte irregular de resíduos, como disseminação de doenças, enchentes e deslizamentos”, afirma Márcio Matheus, presidente do Selurb.

O mercado de gestão de resíduos sólidos movimenta R$ 28 bilhões por ano e emprega quase 350 mil pessoas no Brasil. A expectativa, com o Marco Legal, era crescer 50% já nos próximos dois anos, com a promessa de aumento das oportunidades para a iniciativa privada. No entanto, se a lei for sancionada como está, o setor teme retroceder enquanto água e esgoto irão avançar. No país, 51% das cidades ainda têm lixões, que causam problemas à saúde pública e meio ambiente; e a reciclagem não alcança os 4%, de acordo com o Índice de Sustentabilidade de Limpeza Urbana (ISLU).

“Esse é o único ponto crítico da nova legislação. Todo o restante foi estruturado para dar a segurança jurídica e isonomia necessárias para a atração de investimentos privados, que vão permitir que o Brasil se desenvolva nessa área”.

Um novo estudo feito pela consultoria EY em parceria com o Selurb mostra que, caso os serviços de coleta e manejo de resíduos sólidos sejam equiparados aos de fornecimento de água e esgoto, com cobranças de tarifa diretamente do consumidor, por exemplo, a tendência é que ocorra uma série de benefícios ambientais, por conta da mudança de comportamento da população. Entre esses benefícios, estão a drástica redução da quantidade de lixo gerado, o aumento da destinação correta e consequente extinção dos lixões, além de um aumento exponencial nos índices de reciclagem. O estudo se baseia em experiências de outros países, como o EUA, e até cidades brasileiras que já aplicaram o conceito de poluidor-pagador, indicado pela OCDE, caso de Joinville, Curitiba e Caxias do Sul. As cidades americanas passaram gerar 50% menos lixo e viram a reciclagem aumentar em 40%.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 2010, já previa que as cidades deveriam implementar métodos de custeio específico para as atividades de limpeza urbana caso quisessem acessar verbas federais. No entanto, em dez anos, este ponto da lei nunca foi posto em prática. Hoje, 41,3% dos municípios financiam os serviços totalmente por meio do orçamento geral da prefeitura. Agora, o novo marco do saneamento retoma esta obrigatoriedade e prevê uma maior fiscalização do governo federal. As cidades que não possuem arrecadação específica para estes serviços segundo o ISLU, possuem destinação correta duas vezes menor e índice de reciclagem equivalente a um terço das demais.

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