Desafios do Brasil no planeta urbano

No Dia Mundial das Cidades, 31 de outubro, data oficial da ONU, é importante avaliar os desafios inerentes ao desenvolvimento dos municípios, a começar pela informação de que, a cada semana, 1,4 milhão de pessoas, em todo o mundo, migra para o meio urbano. Isso significa dizer que, a cada sete dias, a civilização global precisa prover alimentação, moradia, transportes, empregos, serviços de saúde e educação para uma nova Porto Alegre (população da capital gaúcha é de 1,48 milhão de habitantes — IBGE/2019).

O fulminante ritmo da urbanização, além dos problemas intrínsecos à dificuldade de atender às necessidades básicas dos indivíduos e famílias, pode sobrecarregar as capacidades locais, contribuindo para aumentar o risco de desastres naturais provocados pelo homem. Invasões, loteamentos clandestinos sem qualquer tipo de infraestrutura de saneamento básico, queimadas, obstrução e poluição de rios e córregos e desmatamento sem compensações são alguns dos efeitos colaterais da incapacidade de resposta do Estado e provocam graves danos urbano-ambientais.

Os problemas inerentes ao acelerado crescimento das populações urbanas são mais graves nos países em desenvolvimento, dentre eles o Brasil. Aqui, como em outras nações, a demanda mais premente refere-se ao déficit habitacional. Trata-se de uma prioridade, pois habitação digna é o portal da cidadania. Sua ausência agrava a exclusão, gera a ocupação irregular do solo e provoca graves consequências socioambientais.

O déficit habitacional brasileiro, de sete milhões de moradias, tem múltiplas causas, sendo as principais: falta de planejamento e projeções da expansão demográfica; restrições ambientais; dependência de verbas públicas; crédito caro; legislações urbanísticas elitistas; judicialização de projetos aprovados; leniência com ocupações irregulares; inexistência de políticas públicas que incentivem investimentos privados; e aversão ao adensamento e verticalização.

Ademais, no Brasil, a doutrina ambiental das últimas décadas tem restringido ainda mais o uso e ocupação do solo. Relevantes áreas urbanas e de expansão urbana são congeladas para efeitos de desenvolvimento imobiliário, diminuindo as possibilidades de produção de moradias, especialmente a de baixa renda. Isso sem razão alguma, pois temos tecnologia, agentes públicos competentes e empresas altamente profissionais para criar espaços sustentáveis.

Ademais, os centros das cidades estão se deteriorando e perdendo habitantes de moradias dignas, em contrapartida ao aumento de ocupações irregulares de prédios ou mesmo de moradores de rua. Este fenômeno abrange as grandes cidades de nosso país e resulta principalmente de legislações elitistas, ausência de zeladoria por parte da administração pública e falta de incentivos a investimentos privados.

Os centros só serão reabitados se oferecerem boas condições às famílias. Para sua rápida recuperação, precisamos de soluções disruptivas e inovadoras, como o incentivo ao capital privado. O poder público pode atrair recursos para novos projetos com medidas como isenções de IPTU ou de cobranças sobre adicionais de área construída, ampliação dos coeficientes de aproveitamento e gabarito, rapidez nas aprovações de projetos e melhoria da infraestrutura. A contrapartida está na maior arrecadação tributária, no bem-estar da população e, principalmente, na rapidez da transformação.

A consciência da sociedade também é relevante. Todos reconhecem o problema, mas quando se fala em adensamento, verticalização, novas obras ou supressão de vegetação, a aversão é geral. A crítica volta-se contra o empresariado da construção civil, taxado de especulador, e à prefeitura, acusada de submeter-se aos interesses dos poderosos.

Por todos esses problemas, o Brasil é um dos países que têm dificuldade de responder aos desafios apontados pela ONU. Assim, é urgente que, em paralelo às ações e reformas voltadas à retomada do crescimento econômico, tenhamos uma nova e eficaz política de desenvolvimento urbano, com a racionalização das aprovações de projetos, menos restrições ao adensamento e crescimento vertical dos municípios, mais crédito imobiliário e políticas públicas de estímulo aos investimentos.

Até solucionarmos essas questões, não teremos muito o que comemorar no Dia Mundial das Cidades.

*Luiz Augusto Pereira de Almeida é diretor da Fiabci/Brasil e diretor da empresa de planejamento urbano Sobloco.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Topo