A Reforma Tributária deve ser mais que um “puxadinho”

Alessandro Spilborghs – Foto: Arquivo Pessoal

Não é de hoje que ouvimos falar sobre a necessidade urgente do sistema tributário ser reformado, como também é comum a reclamação do governo (especialmente nos últimos anos) sobre a queda na arrecadação tributária. “Curioso” é que a reclamação costuma ser atendida em tempo recorde com incontáveis alterações na legislação, quase sempre impondo aumento na cobrança, enquanto que a reforma tributária tão solicitada e que sempre foi acompanhada do adjetivo urgente é proposta e engavetada, reformulada e reapresentada, alvo constante de rodadas de negociação entre os parlamentares.

Enquanto se arrasta a discussão, o governo continua incorrendo no erro histórico de aumentar tributos para estancar a queda arrecadatória e com isso agravar ainda mais o período recessivo pelo qual o Brasil (ainda) atravessa, embora nos últimos meses tenham sido revelados alguns números minimamente melhores em relação à queda no desemprego[i] ou quanto ao aumento do consumo[ii].

Ocorre que essa aparente melhora é frágil, ante ao longo período de declínio da economia nacional, ou seja, na última década, o país permaneceu mais tempo e em um declive mais acentuado se comparado a acanhadas notícias de reaquecimento econômico e por prazos mais curtos.

A ineficiente e, muitas vezes, equivocada gestão do setor público (sem colocar o cancerígeno problema da corrupção nos debates) desde a época das empresas públicas de orgulho nacional[iii] o Estado Brasileiro insiste em cometer os mesmos erros nas tentativas de controlarem a diminuição na arrecadação de tributos. Em qualquer período recessivo é natural para a população cortar gastos e os primeiros impactados são serviços, logo depois produtos, substituindo-os por outros mais baratos ou simplesmente evitando-os. O medo em perder o emprego ou a agonia por estar desempregado justificam essas atitudes, com isso a economia gira mais lentamente e o empresariado é forçado a buscar alternativas para se manter em atividade: adia investimentos, deixa de contratar, diminui a produção…

Por consequência, a arrecadação tributária cai e, para enfrentar a situação, o governo aumenta os tributos! Trata-se de apagar o fogo com gasolina. Quanto maior a carga tributária, mais caros se tornarão os produtos e serviços e a economia passa da estagnação a girar para trás.

Porém, a culpa não é apenas do Executivo, culpada também é a legislação tributária (ou melhor dizer os legisladores) e a forma como a tributação foi estruturada no Brasil. Em 2003 era aguardada uma robusta reforma tributária e, ao final, aprovaram não mais que uma mini reforma com o advento da EC nº 42/03. De lá para cá apenas o ICMS recebeu uma nova regulação sobre sua incidência nas operações interestaduais de mercadorias e serviços com a EC 87/15. É pouco, é muito pouco diante das necessidades do País.

A proposta que tramita no Congresso Nacional prevê a extinção de vários tributos como o IPI, o ICMS, o ISS e ainda PIS e COFINS. Seriam substituídos por uma espécie de Imposto sobre o Valor Agregado através de dois modelos: um sob competência dos estados (os quais também permaneceriam com o IPVA e contribuições previdenciárias) e outro sob competência da União, que incidiria exclusivamente sobre petróleo e seus derivados, como também sobre cigarros, energia elétrica e serviços de telecomunicação. Aos municípios, comportariam a tributação sobre a propriedade e a transmissão de bens imóveis (IPTU e ITBI), contribuições previdenciárias e iluminação pública (Cosip).

A chamada reengenharia tributária lançará luzes sobre o que realmente deve sofrer maior tributação: a renda. Não que hoje não seja o imposto que mais arrecada, porém, é o imposto que conduz pelo caminho mais curto em busca da justiça fiscal. Isso porque a renda é um dos pontos mais peculiares que um cidadão pode apresentar, logo, haver a possibilidade de uma tributação quase que individualizada é o sonho de qualquer Ministério da Fazenda. Tributar a pessoa de acordo com sua real capacidade de contribuir com o Fisco é tratar os desiguais exatamente na medida das suas desigualdades. Portanto, quanto mais discriminatória for a tributação da renda (adequando-se a cada contribuinte) mais igual será o sistema tributário nacional. Injusto é o tratamento que se dá à sociedade sem considerar suas particularidades[iv].

Atrelado a isso, se os impostos que restarem sobre o consumo tiverem suas alíquotas variadas conforme a essencialidade dos serviços e produtos (e não conforme a conveniência de segmentos mais poderosos), como também for mantida a proposta em desonerar a tributação sobre máquinas, equipamentos, remédios e alimentos em geral, o Brasil pode retomar o caminho do crescimento que, porém, para isso, exigirá dos Poderes Legislativo e Executivo algo que a Constituição Federal, desde o dia 5 de outubro de 1988, estabeleceu como objetivo fundamental desta República: promover o bem de todos.

*Alessandro Spilborghs é coordenador do curso de pós-graduação em Direito Tributário da rede de ensino LFG

[i] http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2017-09/temer-diz-que-queda-no-desemprego-com-criacao-de-720-mil-vagas-e-boa

[ii] www.em.com.br/app/noticia/economia/2017/10/14/internas_economia,908595/aumento-do-consumo-tem-sido-determinante-diz-ilan.shtml

[iii] http://www.infomoney.com.br/blogs/economia-e-politica/terraco-economico/post/5190344/estatais-sao-orgulho-nacional-petrobras-eletrobras-correios-dizem-contrario

[iv] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. São Paulo/SP: Malheiros, 2009, pp. 17 e 18.

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