Ibama abre mais um processo contra Volkswagen e pode aplicar nova multa por poluição

Montadora questiona metodologia utilizada em testes da Cetesb e pede anulação da primeira punição, de R$ 50 milhões; especialista questiona argumentos da empresa

Volkswagen Amarok 2015 Highline

Depois de ter multado a Volkswagen em R$ 50 milhões por ter vendido carros com um dispositivo capaz de burlar testes de emissões no Brasil, o Ibama abriu um segundo processo administrativo contra a empresa. Desta vez, o órgão pretende calcular os danos ambientais da fraude, o que pode resultar em nova multa e aplicação de outras penalidades.

Segundo Gilberto Werneck, coordenador de Gestão de Qualidade Ambiental do Ibama, este novo processo administrativo irá determinar quanto as 17.057 picapes Amarok fraudadas poluíram a mais do que o permitido pela lei brasileira em vigor quando os carros foram vendidos. O Site teve acesso a dados preliminares de um novo estudo da Cetesb, feito a pedido do órgão federal, que irá orientar os técnicos nessa segunda análise.

Os especialistas da Cetesb concluíram que a fraude fez com que fossem emitidos no Brasil entre 2011 e 2016 ao menos 646,4 toneladas de óxidos de nitrogênio (NOx). No segundo cenário, o nível de emissão de poluentes chega a 2.737,2 toneladas no mesmo período. Foram considerados dados obtidos no primeiro estudo: as picapes testadas emitem em média 1,101 g/km de NOx, sendo que não poderiam poluir mais que 0,7 g/km. Em média, o software responsável pela fraude diminuía as emissões em 0,26 g/km apenas durante os testes oficiais.

Na prática, as picapes emitem cerca de 57% a mais do que o permitido pela fase L4 do Proconve, vigente quando as unidades fraudadas foram vendidas. “O Ibama abriu novo processo administrativo para apurar a degradação ambiental causada pelos veículos Amarok e irá apurar qual destes valores será considerado para o cálculo de nova multa e medidas mitigadoras”, afirma Werneck.

Volkswagen Amarok em testes com sistema Portable Emissions Measurement System – PEMS

Danos à saúde

A professora Maria de Fatima Andrade, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, explica que a emissão de NOx deve ser controlada com rigor não só por conta dos efeitos à natureza, mas também pelos prejuízos à população. “O dano à saúde é mais perceptível a curto prazo, enquanto o dano ao meio ambiente é notado a longo prazo. Quando há um aumento desse poluente, também há aumento dos outros poluentes. O NOx não é por si só um problema, mas ele forma uma reação em cadeia com outros poluentes“, explica. Além de formar ozônio quando entra em contato com outros compostos, o NOx gera pequenas partículas capazes de entrar na corrente sanguínea.

Para a professora, será difícil determinar uma forma de compensar os danos das toneladas de poluição emitidas além do esperado pelas picapes Amarok, mas há formas de se amenizar indiretamente os efeitos na saúde. “Poderia ser feita uma taxação dos poluentes emitidos acima do permitido para que esse valor seja revertido para o sistema de saúde. Afinal, é o sistema de saúde que arca com os custos do aumento de problemas respiratórios na população por conta das emissões”, afirma.

Recurso

Antes da abertura do segundo processo administrativo, a Volkswagen do Brasil já vinha se defendendo da primeira multa de R$ 50 milhões aplicada pelo Ibama. A montadora enviou recurso ao órgão solicitando a anulação total da penalidade por discordar da metodologia utilizada pela Cetesb nos testes. “A utilização de veículos de 2011, na tese da montadora, teria prejudicado a apuração da suposta fraude, pois os veículos teriam quilometragem acima de 80 mil quilômetros. Além disso, as variações observadas nas emissões, segundo a empresa, não seriam suficientes para comprovar a tese de que houve interferência de um dispositivo de ação indesejável”, explica Werneck. O órgão ainda analisa o recurso para decidir se suspende ou mantém a multa.

Volkswagen Amarok em testes com sistema Portable Emissions Measurement System – PEMS

A professora Maria de Fatima, porém, não vê falhas nos testes. “Essa argumentação pode até funcionar do ponto de vista jurídico, mas não do ponto de vista científico“, afirma. Isso porque os carros utilizados para testes laboratoriais precisam atender a padrões específicos. “Eu diria até que os índices do teste são conservadores porque eles consideram veículos em bom estado, com a manutenção em dia, usando combustível certificado. No dia a dia, nem sempre é assim e o carro pode ter um desempenho, na prática, pior”, diz.

A montadora também recorreu da multa de R$ 8,3 milhões aplicada pelo Procon com relação ao mesmo caso. O órgão ainda analisa os argumentos da empresa para decidir se altera a penalidade.

Outro lado

Contactada pela reportagem, a Volkswagen do Brasil afirmou que  já recorre da decisão do Ibama e reforçou que, até o momento, a decisão ocorre em escala administrativa e baseada em foro técnico.:

Em posição oficial sobre o tema, a marca declarou:

“A Volkswagen recorreu da decisão do IBAMA relativa ao tema e aguarda a apreciação do órgão, ainda em esfera administrativa. Portanto, as discussões sobre a atuação do software, os níveis de emissões das picapes Amarok comercializadas no mercado brasileiro, assim como a observância por parte da Volkswagen da legislação ambiental aplicável no Brasil, acontecem em foro eminentemente técnico.

Mesmo ciente de que este tema no Brasil se diferencia do ocorreu em outros mercados e países, a Volkswagen convocou uma ação de recall para o modelo Amarok, para a substituição do software da unidade de comando do motor. O agendamento para o serviço nas concessionárias da marca teve início no dia 03 de maio. Esta ação envolve um total de 17.057 unidades, com data de fabricação de 03/12/2009 a 11/11/2011″

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