Condição análoga a de escravo marca rotina de trabalho em fazenda no Pantanal

Grupo de cinco homens dormia em barraco sem instalações sanitárias e há quase 60 dias não recebia pagamento pela construção e reforma de cercas.

Foto: MPT/MS – Divulgação

Campo Grande (MS)  O pantanal de Mato Grosso do Sul voltou a protagonizar o resgate de trabalhadores em regime de escravidão. Dessa vez, o flagrante ocorreu em fazenda localizada a 240 km do município de Corumbá, na região conhecida como Nabileque. Um grupo de cinco homens, contratado para construção e reparo de cercas, foi encontrado por representantes do Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego e Polícia Militar Ambiental na última terça-feira (25).

Os trabalhadores viviam em barraco de madeira, com piso de terra, dormiam em camas adaptadas em tábuas e tijolos, e dividiam o espaço com remédios para gado, sacos de sal, material de montaria, galinhas, porcos e insetos. No alojamento, não havia instalações sanitárias, o que obrigava os homens a fazer necessidades fisiológicas no mato e a tomar banho com mangueira pendurada na parte externa do barraco. O preparo de alimentos era feito em fogão de lata improvisado no chão e as refeições realizadas sobre tocos existentes no local.

Segundo relatos, eles estavam na fazenda desde março deste ano e trabalhavam em torno de dez horas por dia, com intervalo curto para descanso e sem equipamentos de proteção. Quando necessário, o repouso aos domingos era interrompido. “A água vinha de ‘corixo’ e era utilizada para beber, cozinhar, lavar roupa e tomar banho. Estou há dias doente por consumi-la”, contou Marciano Rodrigues de Barros, de 60 anos.

Foto: MPT/MS – Divulgação

Pelos serviços contratados, os trabalhadores deveriam receber R$ 60 por dia, o que nunca aconteceu. Também não houve registro em carteira nem exame médico admissional. As frentes de trabalho ficavam distantes cerca de cinco quilômetros do alojamento e eles percorriam o trajeto inicialmente a pé. “Há duas semanas, chegou um trator com carretinha de madeira para nos levar, junto com ferramentas, motosserras e rolos de arame”, revelou outro senhor, Luiz Aparecido Teodoro Vieira.

Os trabalhadores foram retirados da fazenda por policiais e auditores, retornando ao município de Miranda, onde residiam. Além do grupo, foram ouvidos o empreiteiro Acilino da Silva Claro, conhecido pelo apelido de “Dão” e que intermediou a negociação do serviço, e o gerente da fazenda.

Ao final dos depoimentos, ficou apurado crédito de quase R$ 24 mil a título de verbas rescisórias, já deduzidos as contribuições previdenciárias e o recolhimento ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. A data do pagamento aos trabalhadores definida em audiência agendada para a próxima terça-feira, 2 de maio, na sede do Ministério Público do Trabalho em Campo Grande.

“As denúncias têm circulado de forma mais rápida entre os órgãos de fiscalização, contribuindo para uma apuração mais eficaz dos direitos violados e para a penalização dos infratores”, destacou o auditor-fiscal do Trabalho Antônio Parron, citando a informalidade nas relações de emprego como o “gatilho” para uma sequência de irregularidades trabalhistas.

Nessa linha de avaliação, o procurador Jonas Ratier Moreno enfatizou o aumento da precarização do trabalho como um dos efeitos nocivos da crise econômica que atinge o país. “É crescente o número de trabalhadores que se sujeitam a determinados serviços e condições, em lugares cada vez mais distantes dos ‘olhos’ da fiscalização, como é caso que identificamos nessa operação”, ilustrou. A denúncia, acrescentou o procurador, pode ser feita pelo site do Ministério Público do Trabalho (www.prt24.mpt.mp.br). Disque 100 ou pessoalmente, sendo preservada a identidade do denunciante.

Em fevereiro deste ano, outros quatro homens foram também retirados de uma fazenda no pantanal, durante a operação batizada de Shemot, que significa êxodo em hebraico. Um deles estava há 20 anos no local.

Ainda em 2017, força-tarefa resgatou de condições degradantes 11 trabalhadores de duas fazendas nas proximidades do município de Bataguassu.

Fonte: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul

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