Trabalhadores resgatados em condições escravas são indenizados no MS

Além das verbas rescisórias, ficou acordado o pagamento de danos morais individual e coletivo

Foto: Divulgação

Campo Grande (MS)  Lino da Conceição faz parte de uma estatística ainda invisível para a maioria das pessoas. A de trabalhadores em condição análoga a de escravo. A história dele fica ainda mais singular porque foi resgatado dessa realidade após 20 anos de submissão. E poderá, agora, construir um novo futuro com as verbas trabalhistas que recebeu na quinta-feira, dia 23 de fevereiro, durante audiência no Município de Corumbá, interior de Mato Grosso do Sul.

“Eu dormia em barraco de lona e quando chovia molhava tudo”, lembra Lino, que tem 64 anos, pouco menos da idade da Consolidação das Leis do Trabalho, promulgada em 1º de maio de 1943. O trabalhador não tinha documentos, dormia em cômodo sem qualquer condição de higiene, bebia água com aparência de óleo diesel e fazia necessidades fisiológicas no mato.

Outros três homens – Bertoldo da Silva Mendes, Ramão Gomes de Amorim e Antônio Marcos da Silva – foram retirados junto com Lino de uma fazenda localizada no Pantanal, em região de difícil acesso. Para encontrá-los, somente com abordagens aérea, terrestre e fluvial, por meio de operação que envolveu Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Militar Ambiental, Polícia Federal e Polícia Civil. “A atuação articulada tem gerado excelentes resultados no combate ao trabalho escravo e, com isso, conseguimos levar mais dignidade à vida dessas pessoas”, resumiu o procurador do Trabalho Paulo Douglas Almeida de Moraes.

Na audiência do dia 23, dois trabalhadores receberam o pagamento integral das indenizações: Bertoldo (R$ 6.823) e Ramão (R$ 2.289,35). O pagamento a Lino da Conceição será feito em seis parcelas. A primeira, de R$ 14.154,96, foi entregue também no dia 23, sendo que as demais serão efetuadas nessa data dos meses seguintes. Já os valores devidos a Antônio Marcos (R$ 3.283,01), que não compareceu à audiência, serão depositados judicialmente. Quanto ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, este será depositado em conta vinculada a cada trabalhador. A soma de tudo ultrapassa R$ 100 mil.

Foto: Divulgação

Além desses pagamentos, o fazendeiro Gregório da Costa Soares assumiu, em Termo de Ajuste de Conduta (TAC), o compromisso de compensar os trabalhadores por dano moral individual e a sociedade por dano moral coletivo. Três trabalhadores irão receber o dobro do valor obtido com as verbas rescisórias e demais haveres trabalhistas. Já Lino da Conceição optou por uma residência no valor de R$ 150 mil. Essa aquisição contempla tanto o dano moral individual como a aplicabilidade da prescrição quinquenal. A prescrição se refere ao prazo de cinco anos para que o empregado possa reclamar as verbas trabalhistas. Como Lino estava há 20 anos na fazenda, a residência será oferecida como indenização pelos 15 anos não contabilizados nas verbas rescisórias.

A título de dano moral coletivo, acordou-se o pagamento de R$ 200 mil, dividido em quatro parcelas vencíveis a partir de setembro de 2018. Esse valor será convertido em bens destinados a instituições públicas ou privadas sem fins lucrativos da região, definidas previamente pelo Ministério Público do Trabalho. O descumprimento resultará em multa de 100% do valor remanescente devido.

Reincidência

O fazendeiro Gregório da Costa Soares é reincidente no crime de reduzir alguém à condição análoga a de escravo. No final de 2013, ocorreu uma fiscalização na propriedade dele, que resultou no resgate de três trabalhadores.

Se condenado, o empregador poderá responder pelos crimes de redução à condição análoga a de escravo (dois a oito anos de reclusão) e omissão de anotação em carteira de trabalho (dois a seis anos de reclusão).

A operação Shemot – que significa êxodo em hebraico – teve início no dia 7 de fevereiro a partir de inquérito instaurado na Delegacia da Polícia Federal em Corumbá. O inquérito trazia informações de que uma pessoa de origem indígena era submetida a situações degradantes de trabalho.

Fonte: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul

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