A dívida pública e os trabalhadores

Clemente Ganz Lúcio, sociólogo e diretor técnico do DIEESE – Foto: Divulgação

Clemente Ganz Lúcio, sociólogo e diretor técnico do DIEESE – Foto: Divulgação

O Estado se financia por meio (a) de impostos, contribuições e taxas cobrados da sociedade e que incidem sobre a renda (salários, lucros, aluguéis), o patrimônio ou o fluxo de riqueza (venda ou transmissão de bens e imóveis); (b) da atividade produtiva das empresas estatais e de seus resultados; (c) de empréstimos tomados junto à sociedade. As melhores formas de financiamento são as duas primeiras e, a pior, a tomada de empréstimo.

O endividamento é um aumento provisório da receita pública com a promessa de pagamento futuro com juros. Portanto, a dívida tem um custo. Se o empréstimo gera investimentos que aumentam a capacidade produtiva da economia e a infraestrutura econômica e social, gera-se crescimento econômico, o que repercute no aumento da receita do Estado, que cria capacidade para pagar as dívidas, a depender da taxa de juros comprometida. Se, entretanto, o empréstimo não gera um ativo para o crescimento e não fortalece a receita pública, geralmente a dívida cresce e passa a comprometer cada vez mais o orçamento do Estado, obrigando-o a fazer cortes para economizar e amortizar a dívida (o principal) e pagar os juros. Se não é paga, a dívida cresce de maneira ainda mais perversa, acumulando-se sobre os juros não pagos. Depois vêm os juros sobre os juros e a bola de neve cresce sem base produtiva correspondente.

A definição dos mecanismos de tomada do empréstimo (tipo de título, prazo etc.) e sobre qual será a taxa de juros são, entre outras, decisões dramaticamente estratégicas que comprometerão, por décadas, o orçamento público financiado pela sociedade. Quem paga a conta é sempre a sociedade. Por isso, todo empréstimo deve ser uma operação cuidadosamente analisada pela sociedade, por meio de órgãos de representação e de controle social.

A dívida pública brasileira é um enorme e grave problema do Estado e da sociedade. As escorchantes taxas de juros promovem vultosas transferências de renda de toda a sociedade aos detentores da dívida pública (empresas, bancos, rentistas, fundos de investimento etc.), debilitando a capacidade fiscal do Estado para realizar investimentos e financiar as políticas públicas.

É essencial que os trabalhadores entendam e atuem no sentido de debater e se posicionar sobre como tratar a dívida pública brasileira, reduzindo-a. Para subsidiar a discussão, o DIEESE produziu a Nota Técnica 148, Dívida pública e compressão do orçamento: o que resta aos trabalhadores (disponível em www.dieese.org.br), que esmiúça a dívida atual de R$ 3,2 trilhões. Só para dar ideia, o custo da amortização da dívida pública e os juros anuais em 2014 corresponderam a mais do que o dobro do gasto com previdência social naquele ano.

Há inúmeras armadilhas que devem ser desmontadas para reduzir o estoque e o perfil da dívida (curtíssimo, curto, médio e longo prazo), bem como para trazer os juros para padrões civilizados. Um trabalho que exigirá muito apoio político para que se tomem decisões cabíveis, porém muito difíceis. Enfrentar os problemas da dívida é condição para viabilizar e sustentar o crescimento econômico do país, bem como ação necessária para estancar um maligno sistema de transferência e concentração de riqueza. Motivos suficientes de prioridade e urgência para a ação política dos trabalhadores.

[1] Sociólogo, diretor técnico do DIEESE, membro do CDES – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

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